O artista, Júlio Cunha |
A exposição do artista Júlio Cunha, na Porta 43, é uma retrospectiva de trabalhos desde 1998 até 2014.
Utilizando uma diversidade de suportes materiais (tela, azulejo, prato, vidro, madeira) o artista desvela a complexidade da sua criação, revelando-se-nos. Júlio Cunha crê que, tal como os artistas clássicos, não deve estar confinado a um único material porque a essência/força criadora é potenciação plural, não devendo ser mutilada.
Nesta exposição há um rosto que se me impôs, cuja forma é pontiaguda, e que segundo Júlio Cunha teve como musa inspiradora Louise Brookes, uma actriz americana, notabilizada nos anos vinte.
Se seguirmos o traço do artista, com uma reminiscência picassiana, na pintura com o nome da famosa actriz, percebe-se que o cabelo, meticulosamente (des)ordenado, acompanha a linguagem do rosto, quer dizer, é um prolongamento do todo que constitui a pintura corporificada na tela. Nesta medida, não há elementos dissonantes, há formas dinâmicas que estabelecem entre si, não uma relação de ruptura mas uma relação de continuidade.
O processo criativo de Júlio Cunha é intenso, hiperbólico, desenrolando-se sob o paradigma da “criação-destruição”. Antinomia deliciosa e real. Com efeito, o artista atira frequentemente as suas obras para o chão … criador. Deita-as por terra, abandonando-as aparentemente, para as recuperar e recriar posteriormente. É como se elas se desenvolvessem secretamente até atingirem a maioridade ou maturidade. O artista não se desvincula delas, sabe-as dentro de si, onde inconscientemente ocupam e laboram no seu universo mental.
As frases inscritas nas telas são pequenas criações, da criação maior que é a obra, aparecendo, segundo Júlio Cunha, tal e qual a escrita automática dos surrealistas, por associação imediata.
E os títulos despertam o imaginário dos fruidores, incitando-os a assumirem o papel activo de inventores de histórias urdidas no decorrer deste jogo dialéctico entre a proximidade e a criação da obra pelo artista e a proximidade e a recepção da obra pelo espectador.
São dois imaginários que confluem e se enriquecem, transformando-se. Eis o papel da Arte: transformar o homem e o mundo.
É imperiosa uma visita a esta exposição. Até ao fim do mês.
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